4/24/2008

Quando vi as propostas do governo para o novo Código do Trabalho pensei que, finalmente, haveria algum combate ao desemprego e principalmente ao trabalho precário. Entre todas as medidas, umas boas, outras menos boas, a que me chamou a atenção foi, obviamente ,a que se refere aos recibos verdes. Se, inicialmente, fiquei feliz por haver alguma tentativa de combate ao flagelo dos falsos recibos verdes, bastaram uns minutos para perceber que esta medida é um presente envenenado. E porquê? Pelo seguinte:

- A taxa de 5% a pagar à segurança social por parte dos "empregadores" de trabalhadores independentes continua a ser muito menor do que as dos contratados, logo continua a compensar optar pelos falsos prestadores de serviços.

-Esse custo facilmente vai recair, em parte (ou mesmo na totalidade) sobre o trabalhador. Ao empregador basta-lhe, no novo contrato de prestação de serviços, estabelecer um valor 5 % mais baixo, o que compensa duplamente pois além de retirar ao trabalhador, vai pagar 5% de um valor 5 % menor.

-O trabalhador a recibos verdes continua a pagar 24,6% à segurança social. Pouco menos do que paga actualmente.

-As vantagens de ter um trabalhador a recibos verdes vão muito além do que estar isento de pagar a segurança social. O trabalhador a recibos verdes não tem direitos. Não tem direito a subsídios de férias, natal, transporte, alimentação, etc. Não tem direito a férias. Nunca recebe horas extraordinárias. Trabalha ao fim de semana e à noite sem qualquer compensação e o facto de não ter direito a baixa a não ser que pague 32% à segurança social - e acreditem que quem tem um ordenado de, por exemplo, 500 euros não pode fazê-lo ,e se for de 1000 euros já tem que pagar 20% ao irs, o que totaliza 52% do ordenado para o estado - faz com que se evite ao máximo esta situação. Isto, além de poder dispensar o trabalhador a qualquer altura. Concluindo, continua, mais uma vez, a compensar às empresas e ao Estado contratar falsos prestadores de serviços.

- Finalmente há aqui um ponto crucial: substituir os contratos por recibos verdes é ILEGAL!! Não consigo perceber como é que um Ministro admite na Assembleia da República que comete uma ilegalidade no seu Ministério e tem conhecimento e não a combate e o país não se indigna. Estamos a falar de uma situação concreta. É ilegal. O trabalhador independente não tem horário de trabalho, não tem que realizar o trabalho no local que o empregador estabelece, não está subordinado a ordens superiores a não ser no trabalho final a apresentar. No caso de recepcionistas, por exemplo, é óbvio que é um falso trabalhador independente. A Universidade de Coimbra opta por esta via e está a cometer uma ilegalidade. Não é como combater a pobreza, que é uma luta quase abstracta, para a qual as medidas podem ou não resultar. Esta taxa vem legitimar essa ilegalidade. É como se agora eu pudesse roubar mas tivesse que pagar uma taxa por isso.

Ou seja, nos casos dos falsos recibos verdes esta medida é só fogo de vista. Não representa um verdadeiro combate. Para se combater esta situação, além das medidas dissuadoras é preciso apostar forte na fiscalização. E começar por fiscalizar o próprio Estado, o que mais viola a lei.

Relativamente às restantes medidas saúdo o governo de Sócrates. Todos sabemos que fazem parte da estratégia política para avançar, em 2009, para a maioria absoluta, mas também sabemos que não há altruísmo na política, por isso, o motivo não me interessa, venham as medidas.